UMA NOVA ALIANÇA
Jeremias é da tribo de Benjamim e originário de Anatot, pequena cidade do interior. Embora de família sacerdotal, está ligado às tradições proféticas do Norte, principalmente a Oséias, e não às tradições do sacerdócio e da corte de Jerusalém. Como Miquéias, ele pertence ao mundo camponês. De maneira crítica, ele traz consigo a visão dos camponeses sobre a situação do país.
A atividade profética de Jeremias se desenvolveu entre os anos 627 e 586 a.C., e pode ser dividida em quatro períodos:
Primeiro período: durante o reinado de Josias(627-609 a.C.)
Com apenas oito anos de idade, Josias foi nomeado rei pelo «povo da terra». Aqui essa expressão indica a camada rural da sociedade. No início deste período, Jeremias acusa a idolatria e luta para que seja erradicada totalmente do país. Do contrário, a situação vai piorar cada vez mais. A conversão se torna necessária e urgente.
No âmbito internacional, a situação política está mudando rapidamente: a Assíria, grande potência da época, se enfraquece cada vez mais, e já não consegue manter controle sobre as regiões dominadas. Josias, agora maior de idade, aproveitando o enfraquecimento da presença assíria, encontra ótima oportunidade para realizar ampla reforma. Na política, ele procura anexar o território do Norte, pertencente à Assíria desde a queda de Samaria em 722 a.C. Na economia, deixa de pagar os impostos cobrados pelos dominadores. Ao mesmo tempo, Josias promove a reforma religiosa. Baseado no «Livro da Lei» (provavelmente o núcleo mais antigo do Deuteronômio), encontrado no Templo, ele tenta eliminar todos os ídolos do país e estabelecer novo relacionamento social centrado na Lei. É um período de prosperidade e otimismo. Por isso até Jeremias emite bom conceito sobre Josias (Jr 22,15-16).
Segundo período: durante o reinado de Joaquim (609-598 a.C.)
Com a decadência da Assíria, as relações internacionais começam a ganhar novas feições. Outros povos, ávidos de conquista e supremacia, despontam no horizonte: citas, medos, babilônios e também os egípcios que tentam ressurgir de um período decadente. Com isso, a faixa da Palestina passa, de novo, a ser palco de disputas políticas e militares. Nessa época morre Josias (609 a.C.), quando tenta impedir a incursão do Faraó Necao, que procura deter o avanço da Babilônia. No retorno, mesmo derrotado, Necao vai a Jerusalém, depõe Joacaz, substituto de Josias, e coloca no trono de Judá o despótico Joaquim. Essa atitude do Faraó pretendia dar na região uma demonstração de força. Pode ser também que Necao confiasse mais em Joaquim do que em Joacaz. O povo detestava Joaquim, e Jeremias critica violentamente esse rei (Jr 22,13-19). É dessa época o famoso discurso sobre o Templo (Jr 7,1-15; cf. cap. 26), que quase custou a vida do profeta.
A Babilônia surge como grande potência, sob o reinado de Nabucodonosor. Jeremias adverte os israelitas que os babilônios, em breve, invadirão o país. Por causa disso, ele é aprisionado como traidor. Assim mesmo, Jeremias continua denunciando o povo que se esqueceu de Deus, por falsear o culto, pela falsa segurança, pelas idolatrias e pelas injustiças sociais. E aponta os principais responsáveis: são as pessoas importantes que detêm o poder em Jerusalém (rei, ministros, falsos profetas, sacerdotes). O profeta estava com a razão, e sua visão realista se confirmou: em 598 a.C., o exército babilônio estava às portas de Jerusalém. Nessa época, o rei Joaquim morreu, provavelmente assassinado. Seu filho e substituto Jeconias, não teve tempo para nada: após três meses Jerusalém era invadida. Então ele, juntamente com altos oficiais e outros importantes, foram levados para a Babilônia (597 a.C., primeira deportação). Sedecias, tio de Jeconias, foi instalado por Nabucodonosor, para reinar em Jerusalém.
Terceiro período: durante o reinado de Sedecias (597-586 a.C.)
Nesse momento decisivo da história de Israel, Sedecias se submete aos babilônios e se mostra indeciso. Em tal situação política, surge uma questão religiosa: Afinal, quem é o povo de Deus? Os desterrados na Babilônia, ou aqueles que ficaram em Judá? Jeremias se nega a participar de uma visão simplista (cap. 24) e coloca o assunto dentro da política realista: Sedecias e a corte de Jerusalém são incapazes de salvar o povo do desastre. Por isso os deportados ainda são os que podem trazer esperança, pois estão aprendendo uma dura lição. Essa idéia leva Jeremias novamente para a prisão. Pressionado por seus oficiais, Sedecias tenta armar uma revolta contra a Babilônia. Avizinha-se o desastre previsto por Jeremias: Jerusalém é sitiada pelos babilônios. Entretanto, Jeremias também vê nos camponeses uma luz salvadora (32,15). Em 587 a.C. se dá a segunda deportação.
Quarto período: depois da queda de Jerusalém (586 a.C.)
Em 586 a.C., Nabucodonosor resolve destruir Jerusalém completamente: incendeia o Templo, o palácio, as casas e derruba as muralhas. Mas concede que Jeremias fique no país. Então, o profeta vai viver com Godolias, novo governador da Judéia.
Nesse mesmo ano, Godolias é assassinado por um grupo antibabilônico, que se vê forçado a fugir para o Egito, obrigando Jeremias a ir com eles. Ficam morando na cidade de Táfnis, de onde mais uma vez o profeta lança suas denúncias (cf. 40,7-44,30).
É difícil situar os oráculos dentro de cada período correspondente. Por isso, nas notas indica-se o contexto dos oráculos mais importantes, para facilitar a compreensão.
Podemos dizer que a missão de Jeremias fracassou em querer que seu povo retornasse à genuína aliança com Deus. Ele se tornou uma espécie de «anti-Moisés», sendo levado para o Egito e vendo seu povo perder as instituições e a própria terra. No entanto, sua confiança no Deus que é sempre fiel lhe deu a capacidade de mostrar, ao povo e a nós, que esse mesmo Deus manterá seu relacionamento conosco, sem precisar de instituições mediadoras (31,31-34).